quarta-feira, 27 de abril de 2016

LADRÃO DE LENHA
           
            Benevides Cascalho residia no povoado de Socapó de Cima. Umas dez ou doze casas compunham o lugar. Gente simples. Lugar pacato. Mas, nas últimas semanas, o Benevides notara que a lenha que recolhia nas redondezas e deixava picada  para consumo da família parece que diminuía, assim da noite pro dia.  Intrigado passou a contar os paus de lenha e confirmou que em algumas noites desapareciam três ou quatro deles.
            - Diacho, Sô! Tem um larápio por aqui. Ah! Mas eu dou um jeito!
            Quatro dias depois, um domingo de manhã, acordou com uma explosão na vizinhança. Totonha, sua mulher, que providenciava o café,  correu em direção ao trovejo para apurar de que se tratava. Levantou-se sem pressa o Cascalho e aguardou o retorno da patroa.
            - Cruz, credo, Benevides! Foi lá na casa do Mané Fuinha. Parece que é coisa do outro mundo. O fogão de lenha explodiu, rachou no meio e mandou o caldeirão de feijão lá fora, no terreiro. A mulher dele tá lá, branca que nem uma vela, e não sabe de onde veio aquilo.
            Benevides, sim, sabia de que se tratava.
            No dia anterior, numa broca de um pau de lenha deixado por cima do monte, escondera uma bomba cabeça de nego, número quatro, daquelas alinhavadas com barbante forte.
            Sorriu fininho, só na alma, e foi tomar o seu café acabado de passar.

             

segunda-feira, 25 de abril de 2016

CAMPANHA POLÍTICA

            Genibaldo Custódio andava à cata de votos para vereador em Chapadão da Jiboia. Foi descarregado na Vila dos Carrapatos onde se armara palanque para a desova de seu discurso.  E no improviso meio decorado constava umas frases que ouvira de um deputado e que achara propícias para a ocasião. E assim expeliu ele o seu  falatório, não sem antes chocalhar nas bochechas umas três doses de cachaça, para desenferrujar a garganta. E foi mais ou menos assim a sua verborreia:
            - Povo querido desta Vila. Antes de apresentar a minha proposta, antes de dizer que quero ser o melhor vereador desta região, venho afirmar sem qualquer sombra de dúvida que vocês são uns ladrões!... Sim, vocês são uns ladrões!... Vocês roubaram!...
            Um silêncio de constrangimento imperou na pracinha ao redor do palanque. E ele concluiu sobre aplausos de quinze ou vinte escutantes:
            - Vocês roubaram o meu coração que agora pertence à Vila dos Carrapatos.
            Saiu nos braços dos eleitores, sob aplausos de todos. Bebeu mais umas duas ou três, despedindo-se do lugar. Havia compromissos também no Distrito de Bananeiras.
            Fluiu para lá em companhia de um amigo e cabo eleitoral. Uns dois garrafões de cachaça distribuídos no lugar angariaram um público de cerca de quarenta escutadores. Verteu seu discurso usando o mesmo chavão empregado na Vila dos Carrapatos. Só que, mais encachaçado, achou por bem prolongar aquilo que entendia ser o ápice de sua falação. Mas exagerou na repetição:
            - Povo da Bananeira. Conheço este distrito e o povo deste lugar desde os meus tempos de criança e posso assegurar sem qualquer sombra de dúvida: Vocês são uns ladrões!... Vocês são uns ladrões!... Vocês roubaram!... Vocês roubaram!... Sim. São uns ladrões e roubaram...
            Nisso os prováveis eleitores invadiram o palanque improvisado, despencaram de lá o Genibaldo descendo-lhe o cacete de forma exemplar, apesar de sua pretensão de justificativa:
-Esperem, gente, eu posso explicar!... Ai, ui! Eu vou explicar!...
            Explicou depois, em Chapadão da Jiboia, ao enfermeiro que o atendeu depois de levado desmaiado pelo seu cabo eleitoral.
            Depois desta, a política nunca mais fez parte de seu cardápio. Nunca mais.