PARA NÃO PERDER A
VIAGEM
Manelim Mocó grassava na Vila do
Querosene e era pretendido por quase todas as mocinhas solteiras do lugar.
Filho de fazendeiro abastado, o Ceniro Botas, era garantia para uma vida
tranquila de qualquer que fosse a sua futura companheira. Bonito não era, mas
também não assombrava tanto quem dele se aproximasse.
Balduíno
Sopapo era proprietário de uma nesga de terra confrontante com a fazenda do
Botas e via com bons olhos a possibilidade de união entre o Mocó e Ricardina,
sua única filha, diga-se de passagem, bonita. Com vista a viabilizar a
aproximação dos dois, convidou o rapaz para um almoço de domingo, regado a
cachaça, com direito a uma panelada de pé de porco, no qual o Sopapo era
especialista. O rapaz aceitou o convite de bom grado e, no dia marcado,
aportou-se na propriedade do sitiante empesteado de perfume e de roupa domingueira. O Sopapo ultimava o
pé de porco no fogão a lenha numa coberta lá nos fundos da casa e encarregou a companheira, a Manuela,
juntamente com a Ricardina a fazerem sala ao convidado. A moça, que não
simpatizava com o rapaz, andava de olho no Zenóbio, um padeiro lá da Vila.
Ficou por ali por uns instantes e, com uma desculpa qualquer, foi para seu quarto cuidar de uns bordados
numa blusa que seria usada na festa do padroeiro.
A Manuela,
tão logo ficou sozinha com o rapaz, despejou sobre ele um olhar safadoso que
foi correspondido com uma mão sobre os ombros da mulher, seguido de um encontro
de beiços que pararam por aí porque o Sopapo penetrara na sala desavisadamente,
flagrando o colóquio amoroso. Mocó saltou pela janela e suverteu na curva da
estrada. A Manuela, sem outro meio de defesa, justificou:
- A
Ricardina foi lá pra dentro e eu deixei que acontecesse isto para o Mocó não
perder a viagem.
Ele perdeu,
mas a Manuela viajou para o além, movida a uma cacetada de um pau de lenha na
platibanda da fuça.
Com passagem
só de ida.
21.08.2020
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