terça-feira, 6 de setembro de 2016

O HELICÓPTERO DE VICENTE

            Vicente e Lauro entornavam copos e mais copos no Bar de Humberto. Já bastante aperitivados, a conversa de ambos se enveredava para qualquer assunto. Vicente, então, era o que mais diversificava na prosa, naquele lero-lero que lhe era peculiar. Naquela tarde deu para descrever um helicóptero que, segundo ele, havia comprado para transportá-lo do bar para casa e vice-versa. Na sua conversa de encachaçado chamava o aparelho voador de horoscopo. Sua prosa era mais ou menos assim:
            - Olha, Lauro, comprei um horoscopo novo e se você quiser posso te entregar em casa todo fim do dia. O aparelho vai chegar na semana que vem. O Baiano é que vai pilotar o treco.
            E Lauro enfadado com a conversa mole:
            - Ih, Vicente! Conversa mais chata! Vai amolar o boi!
            Vicente insistia:
            - Desse jeito eu não vou carregar você no meu horoscopo. O Baiano já está em São Paulo e vai trazer o bichinho na segunda-feira. Quero que você dê palpite na cor que eu deva pintá-lo. Pensei em azul, mas acho que vai misturar com a cor do céu. Quem sabe vermelho... ou amarelo...
            Humberto, a princípio, se divertia com a pataquada dos dois. Depois começou a cansar de ouvir a mesma lengalenga. Lauro continuava esbravejando:
            - Cala a boca, Vicente! Vai ser chato assim lá no Togó!
            Vicente insistia:
            - Qual a cor que você acha melhor para o meu horoscopo, Lauro? Você ainda não deu sua opinião... Vou levar também Pio de João de Olavo para abrir as porteiras.
            E cachaça desce e a prosa repetitiva continuava. Humberto estava ainda mais enfadado com a conversa mole. Por fim Lauro convenceu o Vicente a ir embora que, na porta do bar, ainda falava sobre o horoscopo enquanto o companheiro procurava pagar a última cachaça que havia bebido. Humberto, prestes a se ver livre da dupla, dispensou o pagamento:
            - Pode ir, Lauro, nem vou cobrar esta última pinga. É presente por você me livrar desta prosa chata de Vicente.
            E Lauro, oportunista:
            - Então me dá aí a saideira.
            - Mas esta você vai pagar, Lauro. Não vou cobrar aquela que você já bebeu.
            E serviu a dose para o freguês.
             Lauro virou-se para a porta onde estava o Vicente e requereu:
            - Volta cá, Vicente, e vamos escolher a cor de seu horoscopo.
            E Humberto, com aquele sorriso que sempre carregava, foi dispensando os dois:
            - Não, Lauro, pode ir. Não vou cobrar, não! Pode ir! Pode ir! Chega de horoscopo.
            E os dois, no fim da tarde morna, saíram ziguezagueando pela rua estreita.


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