quinta-feira, 17 de janeiro de 2019


QUERELA NO BUTECO

            Encontrei-me com Custódio Praxedão ontem na praça principal de Peneira Velha que, mais ou menos nesses termos, me relatou uma querela em que se envolvera dias atrás com Placidino Caixote:
            - Olha, companheiro. O Senhor me conhece de muito e sabe que não sou de aturar conversa fiada e nem tampouco levo desaforo pro meu rancho. O Caixote, metido a besta, não sei se tocado por uma ou duas cachaças, deu de me desonrar lá no buteco do Muquiça, logo na minha própria presença. Pedi que maneirasse o palavreado e desse as provas de que dei calote aqui neste comercinho. O homem me desacatou e tive que usufruir de minha habilidade brigativa. O caldo ferveu e entornou. Larguei nele um cangapé, daqueles que só eu sei o segredo. O homem voou uns quatro metros e voltou irado feito uma cobra na queimada. Aí fui obrigado a soltar a pá do braço direito na panela de seu ouvido. O Caixote rodou feito um pião, pegou o prumo de novo e investiu outra vez. Soltei nele a sola da botina bem na tampa do bucho. O homem arrotou choco e desovou a gororoba do almoço, emporcalhando o piso do buteco. Catou o ar com a fuça já inchada e partiu pra cima, esta pela última vez. Liberei um rabo de arraia que aprendi no cais da Bahia ele pegou voo e saiu pela janela, estatelando a cacunda no calçamento da rua. Lá mesmo dormiu e até roncou.
            Ouvi a conversa e não dei qualquer opinião. E o Praxedão concluiu:
            - Tô sabendo agora que o Caixote quer até me agradecer por uns benefícios que lhe fiz. A orelha esquerda dele, aquela afetada pelo tapão, desentupiu na hora e ele passou a ouvir como nos tempos de menino.  Aquela cacunda curvada que deu a ele o apelido de “camelo”, desempenou de vez e ele agora anda empinado que nem um galo chefe de terreiro.
            Passeei a mão pela base da nuca e despedi-me sem mais palavras.
           

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