BURACO FUNDO
Orozimbo
Cascadura trabalhava em serviços gerais. Fazia qualquer coisa que não
dependesse de uma inteligência mais apurada. Andava sempre com uma foicinha
sobre o ombro para recolher alguma lenha fina por onde passava para preparar
seu guisado no rancho em que residia.
Naquele dia já encoberto pela fumaça
do tempo fora chamado à propriedade rural de Zé Palangana para um serviço até
de porte avultado: Um rego d’água arrombara-se nas proximidades de um barranco
e as águas fizeram uma loca no lugar escorregando-se pela perambeira, brotando
alguns metros mais abaixo,
desabastecendo a propriedade.
O trato para
o serviço estabeleceu-se através de uma empreitada.
- Pois muito
bem, Seu Cascadura, então está combinado. O Sr. volta a água para o lugar
antigo por quinhentos mil réis. Pago a metade no meio da obra e o resto no
final.
Dia seguinte
cedo mãos à obra. O Orozimbo providenciou uma estiva de paus roliços e fechou a
fresta lateral por onde desceu a terra e corria a água rumo ao ribeirão que
serpenteava mais embaixo. O passo seguinte era encher de terra aquele vão,
socando bem cada camada, e depois liberar a água que fora desviada para a
feitura da obra. O vão era avultado e o Cascadura manejando uma carretinha de
madeira cavava nas proximidades e despejava ali o enchimento. E o dia inteiro
aquele inheco inheco da carretinha reclamando alguma lubrificação no único
eixo.
Preenchida a
cratera veio o Palangana inspecionar a obra. Parecia tudo perfeito. Abriu-se o
sulco para reeditar a sequência do rego d’água e fechou-se o desvio. A água
correu mansa e inaugurou a nova passagem. O Orozimbo chegou a liberar um
sorriso na platibanda da cara já carcomida pelos anos.
Questão de
minutos. Uns pequenos redemoinhos foram se formando no leito cavado e aos
poucos a água foi se infiltrando na terra verde e em pouco tempo se acoitou nas
frestas até levar tudo morro abaixo, restando apenas alguns paus recalcitrantes
na estiva do Cascadura.
Novas
tentativas se deram seguidas de novos fracassos. Certo é que a obra só se
ajeitou quando o Palangana mandou fazer uma bica enorme de madeira que
sobrepassou o vão, resolvendo o problema por definitivo.
O Cascadura
que trabalhou muito e não viu seu esforço retribuído a contento, era sempre
objeto de zombaria dos amigos e outros não tantos. Quando bebia umas cachaças,
o que era frequente, exclamava aos quatro cantos:
-Quem falar
comigo no buraco de Zé Palangana eu corto na foicinha.
E brandia a
ferramenta em gesto ameaçador.
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