SEMPRE JUNTOS
Florisvaldo
Carqueja observava, ao lado de Dona Quitéria, o sol chafurdar-se entre as
últimas árvores da montanha. Sentado num toco de braúna estendido frente à casa
simples de seu sítio, remoía a sua vida:
- Éh, Quitéria!
Já fez quarenta anos do nosso casório. Cê lembra ainda?
- Claro,
Florisvaldo. Quem havera de esquecer. Foi num mês de maio. Tempo frio! Cê
lembra?
- Ara se
lembro. E depois, menos de ano de nós dois junto, veio aquela seca brava. Morreu metade do gadinho minguado que nós
tinha! Cê lembra? E ocê sempre do meu lado!... Dispois melhorou. Mais foi uma
labuta danada.
-Éh! Aquela dificulidade...
Mas rompemos adiante... Graças a Deus!
- Depois... uns
três anos depois... Aquele curisco que caiu na orvalheira ali em frente. Cê
lembra? Quase que nós morre. A gente ali
bisservando se a chuva vinha mesmo. E
ocê do meu lado!...
- Eh,
Florisvaldo. Nós sempre junto!...
- E aquele
dia, então, que nós trevessemos a pinguela levando dois balaio de milho. O pau
quebrou e nós caimo no reberão. Cê lembra? O milho foi embora e nós gripou com
a água fria. Ocê sempre ao meu lado!...
-Éh,
Florisvaldo. Nós sempre junto!...
- E agora, mês
atrasado, nós caçando uma soca de milho na palhada quando aquela jararaca me
passou o bico... Ocê, mais uma vez, do meu lado!...
-Pois é,
Florisvaldo! Quase que ocê embarca! Faltou pouco!
- Pois é,
Quitéria. Estou aqui pensando... Quarenta anos... Nós sempre junto. Cê me deu um azar
disgramado!...
Arnon P. Tavares. 12.06.2020
Arnon,nosso escritor mandioqueiro,sua escrita é de uma leveza,bom humor e riquíssima em dialetos locais. Parabéns.
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