quarta-feira, 15 de julho de 2020


NOME A ZELAR

            Porfírio Canela era o mestre da costura em Chavascal das Queimadas. Laborava com mais dois oficiais meia-agulha na rua principal da vila.
            Naquela tarde morna, tempos antigos,  chega o Reduzino Panguela, corte de casemira no vão do sovaco, procurando o alfaiate.
            - Boa tarde, Seu Porfírio. Trouxe um pano aqui pro Senhor fazer um terno para mim.
            Porfírio correu uma rabanada de olhar para a carcaça mal enjambrada do freguês e não gostou do que viu. O homem era meio empenado, não se sabe se para a direita ou para a esquerda. A espinha também tinha lá suas pendências tanto para trás quanto para frente. Porfírio pegou a fita métrica e, meio aborrecido, começou a tirar-lhe as  medidas.  O comprimento do paletó dava uma diferença considerável entre a direita e a esquerda. As mangas não afinavam uma com a outra.  Os ombros descaiam para um lado.  O comprimento da calça também divergia entre uma e outra perna. Retornou ao caderno onde anotara as medidas e inquiriu o freguês:
            - Seu Reduzino, o Senhor precisa dessa roupa para quando? -  E despejou um olhar significativo aos dois auxiliares que observavam.
            - É para o final de agosto, Seu Porfírio. Sou testemunha do casamento de minha afilhada Maria do Rosário.
            - Ih! Final de agosto?! Nóóó! Falta pouco  mais de um mês!... Não vou poder pegar seu serviço. Não vai dar tempo para acabar. Infelizmente!
            Devolveu o tecido ao pretenso freguês e comentou depois de verificar que ela já havia dobrado a esquina:
            - O homem não dá nível e nem prumo em lado nenhum!
            - Ele ia me desmoralizar aí na praça! Eu, hem! Tenho meu nome a zelar.
            14.07.2020

Nenhum comentário:

Postar um comentário