terça-feira, 30 de junho de 2015

O VIOLEIRO



Panicácio Peneira vagava, sem rumo certo,  pelas estradas do sertão. Era violeiro. Vivia de uma cantoria aqui, outra ali. Um desafio numa vila, uma festança noutra. Ia assim levando sua vidinha mais-ou-menos. Também não aspirava um futuro diferente.  Bebeu, comeu, dormiu. Pra quê mais?
Naquele princípio de noite, cansado de vagar pela estrada empoeirada, chegou a uma cabana à beira do caminho. Chamou à  porta e aguardou.  Chegou uma mulher, ainda jovem, que o recebeu desconfiada.
-  Pois não, senhor, o que deseja?
- Boa noite, moça. Estou andando desde cedo e só quero um lugarzinho para descansar por esta noite. Sou violeiro e estou indo cantar numa função lá na Vila dos Paneleiros.
- Ah, moço, não posso recebê-lo. É que sou viúva de poucos meses e, cê sabe, né, as pessoas vão falar.
- Mas, minha senhora, eu só quero dormir. Estou muito cansado da caminhada. Sou apenas um violeiro que quer chegar ao seu destino. Qualquer cantinho me serve. Quero apenas abrigo para esta noite fria.
A viúva, Carmelinda, entre uns trejeitos suspeitosos, acabou cedendo e dando abrigo ao Panicácio.
Manhã seguinte, mal o sol desenfurnava na montanha, o Peneira foi à bica lavar as platibandas da cara e chocalhar água pelo vão das bochechas. Na cabana a viúva já aviava um café no fogãozinho fumacento. No terreiro, os galináceos pescoçavam à procura de alguma cuiada de milho. O Panicácio, observou e comentou:
- Olha, dona Carmelinda, a senhora tem aqui umas dez galinhas e, pelo que vi, são oito galos. Não precisa tantos. Para estas galinhas um galo basta.
A viúva, recolhendo no bule o café que corria cheiroso, resmungou entre os dentes:
- A bem da verdade, moço, galo mesmo é um só.  Os outros sete são violeiros.
Nada mais disse. E nem precisava.
             

Nenhum comentário:

Postar um comentário