CABOCLO ESPERTO
Naqueles tempos antigos, seguiam
estrada afora um padre, o seu sacristão e um caboclo. O padre cumpria a sua missão de confessar os
fiéis e levar-lhes os ensinamentos cristãos, além de ministrar-lhes os
sacramentos. O sacristão era o seu ajudante de ordem e o caboclo, além de
companhia, fazia algum serviço mais pesado.
O avizinhamento da noite levou-lhes a
decidir descansar sob uma lona que lhes servia de abrigo. Água ainda havia no
odre, mas para alimentarem-se apenas um ovo cozido restara, oferta do morador
onde pousaram na noite anterior. Um único ovo. Para uma só pessoa, certamente
lhe mitigaria parcialmente a fome. Já dividi-lo em três partes seria insensato.
Os três ficariam com fome. O padre propôs a solução:
- Vamos dormir um pouco e aquele que
tiver o sonho mais bonito comerá o ovo.
Os demais aquiesceram e procuraram um
encosto para o descanso. Umas duas horas depois o padre convoca os demais e
passa a narrar o sonho que tivera:
- Sonhei que subia pela escada de
Jacó em direção ao céu. A cada passo observava cá em baixo a beleza azul da
terra. Os lagos, os campos, as florestas. Voltava o meu olhar para o alto e via
a porta deslumbrante do céu e, frente a ela, São Pedro, com sua barba branca e
a chave do paraíso na mão.
Os dois ouvintes aplaudiram,
boquiabertos. Foi a vez do sacristão narrar o seu sonho:
- Sonhei, Senhores, que cheguei ao
céu e vi, deslumbrado, o padre entre anjos e santos, em meio ao algodoal das
nuvens. Aquele brilho do lugar e aquela beleza divina me ofuscava o olhar.
Senti um prazer inigualável de estar no paraíso, juntamente com o Senhor Padre.
Mais aplausos. E foi a vez do
caboclo:
- Oia, gente, eu vi que ocês tavam lá
no bem bão do paraíso, junto com Deus seus anjos e seus santos. Pelo visto
ninguém precisava de mais nada. E eu aqui com uma fome miserável. Aí eu fui lá
e comi o ovo.
E um sorriso amarelo brotou-lhe da
face sulcada pelo tempo.
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